2011/06/23

grande amigo

 Hoje, que já é Verão,deram-me as saudades do meu amiguinho.
Como ele gostava de correr na praia, de escavar buracos, de se molhar nas ondas!
Era meigo como uma pomba e forte como um touro e, claro, inconsciente da sua força.
Lembrei-me de tantas das nossas brincadeiras  e por isso me vieram à  ideia os versos do Alexandre O'Neill :

Cão

Cão passageiro, cão rasteiro cor de luva amarela,
apara-lápis, fraldiqueiro,
cão liquefeito, cão estafado,
cão de gravata pendente,
cão de orelhas engomadas,
de remexido rabo ausente,
cão ululante, cão coruscante,
cão magro, tétrico, maldito,
a desfazer-se num ganido,
a refazer-se num latido,
cão disparado: cão aqui,
cão além e sempre cão.
Cão amarrado, preso a um fio de cheiro,
cão a esburgar o osso
essencial do dia a dia,
cão estouvado de alegria,
cão formal de poesia,
cão-soneto de ão-ão bem martelado,
cão moído de pancada
e condoído do dono,
cão esfera de sono,
cão de pura invenção, cão pré-fabricado,
cão-espelho, cão-cinzeiro, cão-botija,
cão de olhos que afligem,
cão problema...

Sai depressa, ó cão, deste poema!

1 comment:

António Gouveia said...

Lembro-me do Papuças, um amigo das férias de Verão, em Sesimbra, com quem, no fim do dia, brincava à beira da água, antes de ir ajudar os pescadoes a puxar a rede, cheinha de peixe.

Obrigado pelo poema, Lu, que me evoca esta memória :)